Economia Solidária: um caminho para o futuro

No último mês de maio, foi aprovada pelo Senado a PEC 69/2019, que inclui a economia solidária como um dos princípios da ordem econômica no Brasil. O texto da proposta, que recebeu 64 votos favoráveis e apenas sete contra, segue agora para a Câmara dos Deputados.

Esses termos são um pouco confusos e nem todas as pessoas conhecem, mas PEC significa Proposta de Emenda Constitucional. Através dela, é possível alterar alguma parte do texto constitucional, sem a necessidade de uma nova assembleia constituinte.

Sendo assim, a PEC 69/2019 reconhece que a ordem econômica de um país precisa assegurar a todos uma existência digna e inclui o princípio da economia solidária como uma política pública para atingir esse objetivo.

Mas afinal, você já ouviu falar no conceito de economia solidária? Sabe como ela funciona?

Em um momento tão crítico como o que estamos passando, é imprescindível pensar em novos e sustentáveis caminhos para nossa sociedade. Além de uma grave crise ambiental, temos 60 milhões de brasileiros em situação de insegurança alimentar. São situações que não podem mais esperar. A mudança é o único caminho possível. 

Então vamos entender um pouco mais sobre o conceito de economia solidária e porque ela pode representar esse grande avanço para nossa sociedade.

Como funciona a economia solidária?

Em primeiro lugar, como o próprio nome já diz, a economia solidária é focada na colaboração e na coletividade. Diferente do modelo capitalista, que tem seu principal foco no lucro, a economia solidária pensa na valorização do ser humano, através do desenvolvimento de empreendimentos coletivos e da criação de uma corrente que envolve quem produz, vende, compra ou troca.

Por isso, os empreendimentos na economia solidária são administrados por grupos, focados na autogestão, na democracia e em um ambiente colaborativo e solidário. Cada funcionário é também um dono. Os problemas são compartilhados, assim como as soluções, conquistas e os lucros.

Esse modelo pode parecer utópico para quem não conhece, mas não é. Atualmente, temos cerca de 30 mil empreendimentos solidários no Brasil, em setores diversos da economia e gerando renda para mais de dois milhões de pessoas. 

Além de trazer uma nova visão e repensar o acúmulo de patrimônio (responsável pela gritante desigualdade social que vemos hoje instaurada no mundo), a economia solidária se preocupa com práticas sustentáveis e com os cuidados com o meio ambiente. Afinal, já está claro que não existe como manter um modelo econômico viável a longo prazo, sem considerar a preservação e recuperação dos recursos naturais do nosso planeta.

Porque a economia solidária se faz necessária no cenário atual

Em 2020, pouco antes da realização do Fórum Econômico Mundial, a Oxfam divulgou o relatório “Tempo de Cuidar – O trabalho de cuidado não remunerado e mal pago e a crise global da desigualdade”. Esse documento colocou em dados o que observamos dia a dia na sociedade global: a desigualdade atingiu níveis recordes em todo o mundo e o número de bilionários DOBROU na última década. 

Tudo isso escancara a necessidade urgente de encontrar uma nova forma de produção e divisão de recursos. Confira abaixo os principais dados do relatório:

  •  Os 2.153 bilionários do mundo têm mais riqueza do que 60% da população mundial.
  • Os 22 homens mais ricos do mundo têm mais riqueza do que TODAS as mulheres da África.
  • Mulheres e meninas dedicam 12,5 bilhões de horas, todos os dias, ao trabalho de cuidado não remunerado. Isso representa, pelo menos, US$ 10,8 trilhões por ano à economia global. O valor é mais de três vezes o valor da indústria de tecnologia do mundo.
  • Se o 1% mais rico do mundo pagasse uma taxa extra de 0,5% sobre sua riqueza nos próximos 10 anos seria possível criar 117 milhões de empregos em educação, saúde e assistência para idosos.

O lucro na economia solidária

Dessa forma, na economia solidária, a maneira de lidar com o lucro é bem diferente da que estamos acostumados a ver na maioria das empresas capitalistas. Ao invés de remunerações escalonadas, muitas vezes injustas, para obter a maximização do lucro, na economia solidária as retiradas, investimentos e fundos de reserva são decididos de forma conjunta, como em assembleias, por exemplo. 

O intuito dessa prática é garantir que todos tenham retiradas justas, estimulando o desenvolvimento social local e das pessoas envolvidas no negócio. Ao mesmo tempo, o empreendimento se mantém saudável e em funcionamento.

Como o lucro é compartilhado, os problemas também são. Existe uma intenção genuína dos envolvidos em encontrar soluções para o funcionamento desse negócio. Em caso de falência, existem exemplos em que os funcionários se envolvem e legalmente conseguem fazer a empresa voltar a produzir, mantendo assim os postos de trabalho de cada colaborador.

O projeto de economia solidária no Mercadinho São José

Um dos pólos gastronômicos mais populares da Zona Sul do Rio de Janeiro, o Mercado São José das Artes, conhecido como Mercadinho São José, foi inaugurado em 1944 com o intuito de abastecer a população local com produtos hortifrutigranjeiros. Depois de décadas de funcionamento, transformações e períodos de crise, o estabelecimento acabou sendo fechado em 2018.

Com o abandono do espaço, o deputado estadual Waldeck Carneiro (presidente da Frente Parlamentar em Defesa da Economia Popular Solidária da Casa Legislativa) em conjunto com a deputada Mônica Francisco, criaram um projeto com o intuito de revitalizar a área e transformá-la em um Centro Público de Economia Solidária (EcoSol). 

A ideia é devolver o espaço para a população do Rio de Janeiro e ainda contribuir para o desenvolvimento da economia solidária no município. O projeto segue em andamento, mas se aprovado vai favorecer a comercialização de produtos agroecológicos, artesanais e orgânicos, todos produzidos com base nos princípios da economia solidária. 

Exemplos de economia solidária

Vamos conhecer alguns exemplos de empresas que já funcionam trabalhando com a metodologia da economia solidária:

  • Cooperativas de reciclagem e de catadores de resíduos.
  • Produtores de alimentos orgânicos (de pequeno e médio porte)
  • Grupos de agricultura familiar
  • Coletivos ecológicos

É nosso papel, como cidadãos, contribuir para o desenvolvimento de práticas que possam trazer melhorias para nossa sociedade. Vale a pena conhecer as empresas onde consumimos e decidir se elas “merecem” nosso dinheiro ou se podemos fazer uma escolha melhor. 

É nosso papel conhecer os projetos que podem trazer desenvolvimento para nosso país e cobrar das autoridades a aprovação e implantação dos mesmos.

A economia solidária também depende de nós.